Justiça suspende projeto de carbono no Amazonas por ausência de consulta prévia a povos tradicionais

Justiça suspende projeto de carbono no Amazonas por ausência de consulta prévia a povos tradicionais

A Justiça Federal, por meio da juíza Marilia Gurgel Rocha De Paiva, determinou a suspensão imediata do Edital de Chamamento Público nº 02/2023 da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SEMA/AM), que visava selecionar empresas para projetos de crédito de carbono (REDD+) em Unidades de Conservação estaduais.

A decisão atendeu parcialmente a uma Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) e estabelece que qualquer avanço em iniciativas de carbono em áreas que afetam comunidades deve ser precedido da Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) a povos indígenas e comunidades tradicionais, conforme a Convenção 169 da OIT.

Inconsistências técnicas e de governança 🛑

O MPF anexou uma Nota Técnica que aponta diversas falhas no modelo estadual, além da violação do direito de consulta:

  1. Integridade Ambiental: A Nota Técnica questiona as metodologias para estimar emissões e reduções, indicando que parte das estimativas tem baixa confiabilidade. O risco é que os créditos gerados (REDD+) não correspondam a reduções reais e verificáveis, o que é uma preocupação amplamente discutida na literatura científica.

  2. Adicionalidade e Vazamento: O documento sugere que a redução do desmatamento pode ser resultado de políticas de comando e controle já existentes, gerando dúvidas sobre a adicionalidade dos créditos. Além disso, o modelo carece de salvaguardas contra o vazamento – o deslocamento da pressão sobre a floresta para áreas fora do projeto.

  3. Governança e Benefícios: A Funai e o MPF alertaram para a falta de clareza sobre a distribuição de benefícios e o papel das comunidades no processo decisório. Muitas UCs do edital fazem limite ou se sobrepõem a Terras Indígenas, exigindo cuidado redobrado.

Decisão da Justiça

O governo do Amazonas argumentou que a CPLI seria realizada “em momento oportuno”. No entanto, a Justiça determinou que a consulta é um elemento constitutivo do processo e deve ocorrer antes de qualquer etapa de planejamento em campo, pois a simples entrada das empresas nas áreas já interfere nas dinâmicas comunitárias e compromete o consentimento livre e informado.

Com a decisão, todos os atos administrativos relacionados ao edital estão suspensos, incluindo a entrada de agentes públicos ou empresas contratadas nas comunidades, sob pena de multa diária.

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